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Saudosista, Amaral exalta passado no Verdão e lembra causos com Edilson

Hoje no Capivariano, volante completa 42 anos neste sábado, data do jogo entre o atual clube e o Palmeiras. Veterano conta histórias com craques da década de 1990

Por Capivari, SP

Amaral vestiu inúmeras camisas na longa carreira como profissional. Foi alvinegro em São Paulo (Corinthians), Rio de Janeiro (Vasco) e Minas Gerais (Atlético-MG), usou tricolor no Rio Grande do Sul (Grêmio) e Pernambuco (Santa Cruz) e teve até experiência internacional em Itália, Portugal, Polônia e Turquia. Mas nenhuma cor lhe cai tão bem quanto o verde. Isso lhe remete ao garoto pobre que saiu de Capivari para vencer na capital, virou titular de um time de craques, atingiu o ápice ao defender o país nos Jogos Olímpicos e ganhou chance de mostrar talento em outros países. Um filme impossível de apagar da memória, mas que, por uma dessas peças que a vida nos prega, não será revisto neste fim de semana.

O volante esperava muito por este 28 de fevereiro de 2014. Ao acertar a volta ao futebol para defender o Capivariano, time de sua cidade, Amaral se viu unido a uma coincidência da tabela: a partida contra o Palmeiras, na reformada casa alviverde, estava marcada para seu aniversário de 42 anos. O veterano se preparou como pôde. Demorou quatro rodadas para estrear, ficou meio tempo em campo e sofreu um estiramento muscular na coxa. Nem o tratamento para acelerar a recuperação o deixou à disposição para o jogo deste sábado. Chateação que tira até o ânimo de ver o confronto ao vivo.

Amaral volante Capivariano (Foto: Carlos Velardi / EPTV)Volante completa 42 anos neste sábado, mas não estará em campo pelo Capivariano (Foto: Carlos Velardi / EPTV)

– Acho que não vou para o jogo. Queria estar ali para incentivar meus companheiros, mas, se for para São Paulo, vai ficar passando um filme, aquele incômodo de querer estar em campo e não poder. Melhor curtir meu aniversário com a família – relatou o jogador.

Não que Amaral precise estar nas arquibancadas da Arena do Palmeiras para lembrar de tudo que passou pelo clube. Em quatro temporadas completas, acumulou partidas (244, com 149 vitórias, 56 empates e 39 derrotas), títulos (tricampeão paulista, bicampeão brasileiro e um Torneio Rio-São Paulo) e amigos. Fez, também, um gol, um dos únicos como profissional. Além, claro, de histórias. O maior contador de causos do futebol brasileiro colecionou passagens marcantes e ri sozinho até hoje ao recordá-las.

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calote e piadas


O volante chegou à capital paulista em 1991 para defender o time júnior. Subiu ao profissional dois anos depois para completar o elenco estrelado do Palmeiras, à época impulsionado pela parceria com a Parmalat. Só em seu setor, jogavam César Sampaio, Flávio Conceição e Mazinho. Ganhou espaço aos poucos, apesar de salário bem menor do que estrelas como Edmundo, Edilson ou Evair (na faixa de R$ 2 mil, segundo memória do próprio atleta).

Foi uma dessas estrelas que lhe estendeu a mão. Edilson chamou Amaral para morar em seu apartamento. Meses depois, o atacante transferiu-se para o Benfica, de Portugal. Ficou só um ano na Europa. Ao voltar, deu de cara com o imóvel vazio. Logo questionou o volante, que respondeu na lata.

– Não tem mais nada. Mandei tudo para os meus parentes em Capivari. Você está rico, não precisa de mais nada daquilo, não.

Amaral, Palmeiras (Foto: Paulo Pinto / Estadão Contéudo)Amaral atuou como titular absoluto no Palmeiras no primeiro semestre de 1996 (Foto: Paulo Pinto / Estadão Contéudo)


Edilson também protagonizou outra história viva na memória do veterano. O volante lembra que o colega de apartamento tinha uma arma em casa (possuía porte) para segurança. O tiro, com o perdão do trocadilho, quase saiu pela culatra. Certa noite, Amaral teve um pesadelo e acordou aos berros. Edilson se assustou e não teve dúvidas: invadiu o quarto do amigo empunhando o revólver.

– Isso ele que me conta, porque nem lembro de nada. Eu lá agitado no quarto, ele pegou a arma, foi andando até lá, chutou a porta e ameaçou atirar. Foi quando eu acordei: "Não, não, pô, estou sozinho aqui, não atira”. Quase morri de susto – diverte-se Amaral.

edílson capetinha e amaral flamengo-pi (Foto: Renan Morais/GloboEsporte.com)Amaral e Edilson mantêm amizade dos tempos de Palmeiras, nos anos 1990 (Foto: Renan Morais / GloboEsporte.com)


Outra passagem curiosa aconteceu durante conversa entre Vanderlei Luxemburgo e Edmundo, técnico e maior estrela do time bicampeão brasileiro em 1993-94. Os dois falavam algo sobre outdoor antes de um treino no Centro de Treinamento do Palmeiras. Amaral, ao lado deles, mas sem falar nada, apenas ria.

Edmundo Palmeiras Paulistão 1993 (Foto: Sergio Gandolphi)Edmundo era um dos grades amigos de Amaral durante a primeira passagem pelo Palmeiras, entre 93 e 94 (Foto: Sergio Gandolphi)

– Edmundo virou para mim e perguntou do que eu estava rindo. Falei que era da conversa. Ele falou: "Mas você sabe o que é um outdoor?". Eu emendei: "Claro, pô, quem não sabe o que é um hot dog” (cachorro quente, em inglês) – conta o veterano.

Amaral também conseguia se divertir quase que sozinho nos tempos de Palestra Itália. Certa vez, chegou ao treino um pouco antes do horário e reclamou de dores de barriga a um dos médicos palmeirenses da época. Após exames iniciais, o volante insistia em tomar um remédio para participar da atividade dirigida por Luxemburgo. O médico vetou, para irritação do atleta.

– Ele me examinou e falou: "Vai ter que operar de apendicite". Eu fiquei bravo: "Pô, estou comendo tudo do bom e do melhor e o senhor fala que tenho que operar de dor de barriga”.

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passado e presente


Não só de histórias engraçadas se resume a passagem de Amaral pelo Palmeiras. O volante, apesar de considerado limitado na parte técnica, fez parte de duas gerações muito vitoriosas do clube. Alternou entre time titular e banco de reservas em 1993 e 94 e ganhou a posição na equipe que fez 100 gols no Campeonato Paulista de 1996. Qual foi melhor? O meio-campista não consegue encontrar uma resposta certa.

– Foram dois times diferentes. O de 1993 era mais encorpado, de 96 era mais leve, time de talento puro. Tanto que depois disso eu fui para a Seleção olímpica e para a Europa. Antigamente era muito mais difícil se transferir para a Itália. Eu joguei duas vezes lá (Parma e Fiorentina) por causa disso.

Existia diferença fora de campo também. Enquanto a equipe de 96 era mais comportada fora de campo, Amaral lembra os problemas de relacionamento que marcaram a geração de 93/94. Tem na ponta da língua os grupinhos formados na Academia de Futebol. De um lado, César Sampaio, Evair, Zinho e Antonio Carlos, experientes e mais calmos. Do outro, Edilson, Edmundo e Roberto Carlos, jovens e esquentados. E onde Amaral ficava nessa história?

Paulistão 1993 torcida Palmeiras (Foto: Marcos Mendes / Agência Estado)Verdão de 1993 era marcado por discussões entre as principais estrelas (Foto: Marcos Mendes / Agência Estado)


– Quando tinha briga, eu abaixava a cabeça e pronto. Senão, sobrava para mim. Só me preocupava em jogar. Cada jogo era uma enxadada (risos). Não podia jogar mal. Era eu quem mais marcava e tinha que carregar o piano para a galera jogar lá na frente. Tinha muita moral com o Luxemburgo (técnico do Verdão nas temporadas 1993-94) e com meus companheiros. Eles brincavam comigo: "Corre aqui senão vai voltar a carregar defunto em Capivari".

A pressão psicológica dos colegas deu certo. Ao se destacar com a camisa alviverde, Amaral virou presença constante nas convocações da seleção brasileira, dirigida na época por Zagallo. Disputou 31 partidas (14 pela principal, 17 na olímpica) e conquistou a medalha de bronze nos Jogos de Atlanta, em 1996. Daí, voou para Parma, Benfica, Corinthians, Vasco, Fiorentina, Besiktas, Grêmio...

Todos os clubes deixaram marcas, mas não como o Palmeiras. A ponto de Amaral lembrar com bastante saudosismo a época do clube, que mudou bastante em alguns aspectos. Fora de campo, o volante enxerga o atual Verdão em estágio superior ao da sua época. Nas quatro linhas, porém, não existe comparação. Isso lhe faz acreditar em uma surpresa no sábado. Agora vestido de vermelho, Amaral sonha em ver, à distância, o Capivariano sair com pontos da capital paulista.

– Palmeiras, na minha época, não tinha estrutura que tem hoje. A gente dormia em umas tábuas duras embaixo da arquibancada, era pernilongo para caramba. Mas, em campo, o Palmeiras de hoje nem se compara ao Palmeiras de antes. Hoje tem grandes jogadores, de nível de seleção brasileira, como o Arouca, o Zé Roberto. O time é dirigido pelo Oswaldo, com quem trabalhei no Corinthians, mas é diferente da minha época. Não tem mais bicho-papão no futebol.

Amaral, volante Capivariano (Foto: Reprodução EPTV)Amaral fez somente uma partida pelo Capivariano em 2015, pois se machucou em seguida (Foto: Reprodução / EPTV)